Carpe Diem
Entenda O Barroco e Seus Conflitos
Cultismo x Conceptismo
No Barroco, podemos definir dos estilos diferentes, marcados por distintas formas de conceber o conhecimento, dois modos, não facilmente separáveis, de assimilar os objetos: ocultismo (saber o como das coisas) e o conceptismo (buscar a essência das coisas).
1. CULTISMO OU GONGORISMO
Para esta linha de pensamento, conhecer seria descrever. O mundo é descrito por meio de sensações, envolvendo as pessoas em uma espécie de “delírio cromático”, o que explica a constante utilização de figuras de linguagem como metáforas, antíteses, sinestesias, além de figuras de sintaxe que tornam o estilo pesado, tortuoso, tais como trocadilhos, dubiedades e hipérbatos.
Os artistas que exploraram este aspecto se voltavam para o jogo de palavras, preciosismo vocabular, erudição, rebuscamento da forma, ou seja, o que estava em pauta era a habilidade verbal do escritor. Nesse sentido, podemos dizer que a realidade é retratada pelos cultistas de forma indireta, já que a preocupação está centrada mais no como representá-la, do que propriamente no representado.
O estilo cultista também recebeu o nome de Gongorismo, por ter como principal representante o poeta espanhol Gôngora.
Exemplo do estilo cultista:
*Reparem no jogo de palavras promovido pelo poeta.
"O todo sem a parte não é o todo;
A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo o todo.
Em todo o Sacramento está Deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda a parte,
Em qualquer parte sempre fica todo."
(Gregório de Matos)
2. CONCEPTISMO OU QUEVEDISMO
Para os conceptistas, o conhecimento pressupunha uma análise cuidadosa do objeto, a fim de conhecer sua essência, chegar aos conceitos que o definem. Seus argumentos se centram na Razão, na inteligência, e pretendem convencer pelo raciocínio, sem prejuízo dos sentidos. Ao invés do exagero e exuberância do cultismo, o estilo conceptista buscava concisão e ordem, operando sob os mecanismos da Lógica, dentre os quais se destacam os silogismos e ossofismas.
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Silogismo: é uma forma de raciocínio dedutivo que, partindo de duas premissas básicas, delas concluem uma terceira, logicamente implicada. Exemplo: Todo homem é mortal. Maurício é homem. Maurício é mortal.
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Sofisma: trata-se de um argumento que parte de premissas verdadeiras e chega a uma conclusão inadmissível, mas irrefutável formalmente, ou seja, inquestionável de acordo com as regras formais do raciocínio. O sofisma tem por objetivo dissimular a verdade por meio de esquemas que aparentam seguir as regras da lógica. Exemplo: Racismo é só uma palavra. Não há por que discutir sobre palavras. Não há porque discutir racismo.
O estilo conceptista também recebeu o nome de Quevedismo, por ter como principal representante o espanhol Quevedo. Por sua preocupação em convencer, o conceptismo encontra-se muito presente na oratória sacra (Padre Antonio Vieira, Padre Manuel Bernardes) e na poesia religiosa (Gregório de Matos).
Exemplo do estilo conceptista:
*Premissa maior: amor infinito de Crismo salva o pecador./ Premissa menor: sou pecador./ Conclusão: espero me salvar.
"Mui grande é o vosso amor e o meu delito;
Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito.
Essa razão me obriga a confiar
Que, por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor de me salvar."
(Gregório de Matos)
ATENÇÃO: Convém ressaltar que o Cultismo e o Conceptismo não são estilos estanques, já que ambos constituem tendências interinfluentes, podendo ser exploradas por um mesmo escritor (como vimos nos dois exemplos de Gregório de Matos) e também em um mesmo texto. Nem sempre a fronteira entre ambos os estilos é nítida, já que idéias e palavras estão intimamente ligadas: quando se joga com idéias, joga-se necessariamente com palavras, e quando se joga com as palavras, há sempre uma idéia intrínseca.
Fonte: http://www.qieducacao.com/2010/09/cultismo-x-conceptismo.html
